quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

A História do CAVEIRÃO- (8ª Parte/ Conclusão )

ESCANINHO DE RECORDAÇÕES

Em homenagem a lendária Policia Militar do Estado do Rio de Janeiro e todos os heróis e heroínas sociais que compuseram e compõem seu efetivo. Seeellvvaaa!!!!

A História do Caveirão ( 8ª Parte/ Conclusão )

Continuação.

Assumi o Comando Geral da Corporação no dia 14 Jun de 2000.

Na primeira oportunidade que as cargas descomunais do Comando, suportadas em ombros frágeis, mas alicerçados por vontade férrea, permitiram, passado algum tempo para superar a internacional crise durante a  qual assumi o Comando, convoquei o Cel Maia, companheiro de longa data, a quem havia entregue os destinos da DGAL ( Diretoria Geral de Apoio Logístico). Conversamos longamente sobre  o projeto da que seria a 1 ª VBTP/T ( Viatura Blindada de Transporte de Pessoal/ Tropa) destinada ao confronto e emprego tático contra traficantes de drogas, armados com fuzis e granadas de guerra e encastelados em áreas criticas de nosso Estado. Nessa ocasião passei  alguns croquis,  sem muito detalhamento,  para ele, nos quais eu registrara em esboço primário o lay-out que eu acreditava ser o que atenderia nossas necessidades naquele momento. ( Eu tinha um certa facilidade de elaborá-los em razão de haver cursado a Faculdade de Engenharia ). O Cel Maia anotou a reunião nos mínimos detalhes e levando os desenhos iniciais  com ele, disse que conversaria com seus auxiliares e prometeu-me uma solução. Ao final deixou o gabinete registrando que também havia se apaixonado pelo projeto.


Passado algum tempo o DGAL pediu-me permissão para visitar o Parque Fabril do Estado de São Paulo, o qual achava após algumas pesquisas, que seria o único capaz de construir uma viatura com as especificações que havíamos estipulado.
Retornou com boas noticias. Havia localizado e entrado em contato com algumas firmas capazes de executar nosso projeto, nos moldes dos desenhos e especificações apresentadas.
 Cumpridas concomitantemente as formalidades legais, e após reunião com o EMG, o pessoal da DGAL e o Cmt do BOPE, Ten Cel Moura, avaliamos as propostas apresentadas. Ato contínuo, fechamos contrato com a firma vencedora. À época o custo estipulado foi na ordem de R 90.000,00 ( noventa mil reais).

Como se tratava de projeto inédito, sem referenciais comparativos,  o tempo acordado começou a ultrapassar o estimado inicialmente. Muitas visitas de inspeção aos locais de fabricação foram realizadas pelo EMG,  DGAL e representantes do BOPE. Até que no 2 º Semestre de 2001, o projeto foi concluído e apresentado no pátio do QG, pronto para a realização dos testes finais. A mais nova arma da PM, sua 1 ª VBTP/T,  a partir daí passaria pelos mais rigorosos testes que o BOPE, o CMM e a DGAL pudessem executar, dada a sua destinação.
Entre outros testes , lembro-me de alguns principais : Compatibilidade entre motor e caixa de marcha, temperatura interna, visibilidade do condutor ( pontos cegos), adequação da torre de tiro/observação, tamanho compatível com o terreno que iria operar, disposição e eficiência de seteiras, a eficácia de linhas de tiro laterais  e frontais, segurança e otimização do acesso e descesso de portas laterais e traseiras, e finalmente blindagem, principalmente blindagem. Cargas e cargas de tiros de fuzis 5.56 e 7.62, estando a Vtr parada e em movimento, foram disparadas contra a mesma, explorando-se todos os ângulos e distancias possíveis. Uma de nossas preocupações era o ricochete. Sua couraça não bastava para nós que parasse as balas/projetis inimigos, tinha que ter a capacidade de não atingir ninguém através de balas ricocheteadas em sua blindagem. Nunca esquecendo que eu já havia passado por experiência terrível relativa a projetís ricocheteados em Vtr Policial para ações de choque, ao utilizar o PALADINO em outrora Operação Policial no Morro da Mineira, já registrado em capítulo anterior.
 Após vários testes de tentativa e erro, descobrimos a fórmula ideal, qual seja, uma camada metálica exterior que amortece mas deixa o projetil penetrar, mantendo-o seguro em parte, e uma camada de blindagem impenetrável interna que impede totalmente o projétil penetrar no interior da Viatura. Desta forma as centenas e  centenas de balas criminosas  dirigidas ao blindado, nele ficariam sem penetrar na segunda camada, a interna , nem ricochetear. Lembrei-me em um primeiro momento dos antigos papeis pega-moscas.
 Após uma infinidade de testes, o sonho do velho soldado se realizou. Ali estava na minha frente, no  histórico e estratégico pátio do QG/PMERJ, a materialização do tão ansiado projeto da 1ª VBTP/T ( Viatura Blindada de Transporte de Pessoal/Tropa) da Policia Militar do Estado do Rio de Janeiro, com a finalidade precípua de  acessar áreas críticas e confrontar criminosos armados com armas de guerra e granadas ceifadoras de vidas de Policiais.


Passo a seguir a registrar alguns questionamentos que sempre me fazem:

1. Por que a Vtr foi distribuída ao BOPE ?

R.Porque se tratava de um Material Bélico novo e inédito na Corporação, tanto pelo modelo quanto aos fins a que se destinava. Tínhamos portanto que testa-lo e retesta-lo  nas mais variadas condições de  combate. Tínhamos que preparar equipes para opera-lo, e criar rotinas técnicas e táticas de procedimento de emprego, principalmente sob fogo inimigo. E ninguém melhor que o BOPE para cumprir essa missão. A UOpE recebeu então a incumbência de ser seu primeiro operador e confeccionar, mediante Diretriz do EMG, um Manual de Procedimento de Emprego da 1ª VBTP/T.

2. Por que a Vtr foi pintada de preto ?

R. Porque inicialmente ela foi orgânica do BOPE, e essa era sua cor padrão.

3. Por que o termo "CAVEIRÃO, o qual com o tempo passou a ser sua  eterna e insubstituível denominação ?

R. Porque o símbolo do BOPE, é a "vitória sobre a morte" identificada heràldicamente como uma Caveira. Como as proporções da Vtr eram bem maiores  que as demais Viaturas, ao se aplicar o símbolo da Caveira tivemos que aumentar suas proporções seguindo os ditames técnicos da aplicação do "segmento áureo" para se atingir a proporcionalidade perfeita. Pois bem, lá ficaram, nas laterais e  capô  da VBTP/T do BOPE grandes Caveiras pintadas. Na prática, grande Caveira é igual a  CAVEIRÃO.  Pronto, com o aumento da exposição da Viatura junto ao público, o próprio povo deu-lhe imediatamente a denominação de CAVEIRÂO,  e ficou, até os dias de hoje. Mesmo que os Chefes que se seguiram , tentassem chamá-la de Pacificador, COTER, Blindado, etc, mas o nome CAVEIRÂO, ficou, para sempre..... Como um ícone no combate a criminalidade violenta, portando armas e granadas de guerra.

4. Já havia a ideia de adquirir futuramente novas Viaturas Blindadas ?

R. Sim, mas somente  após treinarmos  e aprendermos  à exaustão técnicas e táticas através do projeto- piloto.

5. Essas acusações de que Policiais  Militares, ao longo de seu emprego, usavam o auto- falante da Vtr para aterrorizar a população com ditos vulgares tipo : "Atenção, chegou o CAVEIRÃO, eu vim buscar a suuaa aaallmma!!!!", etc.., etc..

R. Nunca foi provado que esses fatos tiveram lugar em algum momento.



Desta forma , a partir do final do ano de 2001, a 1ª VBTP/T ( CAVEIRÃO ) começou a ser empregada em operações reais contra os traficantes de drogas armados com armas de guerra, segundo as Diretrizes do Comando Geral da PMERJ.

O sucesso operacional começou  a surgir imediatamente, levando-nos a seguir fielmente o " Princípío da Exploração do Êxito". Locais que tínhamos alguma dificuldade para incursionar, passaram a ser vasculhados com alta frequência. Sempre usando-se a tática de subir com uma Patrulha de Combate no interior da Viatura Blindada, normalmente sob intenso fogo inimigo, e descer a pé varrendo a área de cima para baixo, com pés de Mercúrio e mãos lançadoras de raios de Zeus, permitindo assim que o restante do BOPE e a Tropa convencional ocupassem o terreno de baixo para cima, já com os sentinelas inimigos fora de combate. Borel, Alemão, Mineira, São Carlos , Juramento, São José Operário,  Maré, Vila Cruzeiro, Caroba, Aço, Estado, Lagoinha, Salgueiro, Vila Ipiranga, Manguinhos, Jacarezinho, Providencia, entre outras áreas críticas,  foram totalmente dominadas com esta nova ferramenta policial.

O que foi altamente gratificante porém, foi ver que na prática o seu papel/conceito de " Colete à Prova de Balas Coletivo" funcionou plenamente. Centenas e centenas de vidas de Policiais Militares , Policiais Civis, Policiais Federais  e Civis passaram a ser salvas de forma direta e indireta.
Foi realizada inclusive no ano de 2006, pelo EMG da Policia Militar, através de sua Seção de Criminalística,  um meticuloso trabalho de perícia nas unidades blindadas que comprovaram e registraram uma quantidade impressionante de impactos de projetís inimigos nas carcaças dos CAVEIRÕES. Impactos esses que se lá não estivessem, fatalmente estariam nos corpos de Policiais e Civis.



 Com o passar do tempo, os novos dirigentes das Policias, tanto PM como Policia Civil  e também de outras Corporações Co-irmãs, do brasil inteiro, inclusive a Federal, adquiriram Viaturas Blindadas semelhantes ao nosso primeiro modelo de  CAVEIRÃO ( 51-0001 ) .                           

Finalmente , pelo menos até o momento, seguidas tentativas de se adquirir modelos excêntricos de Viaturas Blindadas de Transporte de Pessoal/Tropa para emprego policial, nos moldes do CAVEIRÃO, não tiveram o resultado desejado. Primeiro adquiriram-se viaturas com blindagens inadequadas, às quais a Tropa sabiamente passou  a denominar de "cascas de ovo". Depois surgiram algumas montadas sobre chassis de carretas, às quais demonstraram-se inviáveis para operar em becos e vielas de áreas críticas. Depois buscou- se desenfreadamente inspiração em modelos alienígenas, visitando-se os mais variados Países, como Rússia, Israel, Coreia do Sul, Croácia,  E.U.A, África do Sul, Portugal, França, Alemanha, Tibet, Saramandaia, Terra do Nunca, Narnia , etc.etc.etc. sem que o objetivo, até agora fosse alcançado.  Mas até agora, a tropa sente saudade mesmo é da insubstituível Viatura numérica  51-0001, batizada carinhosamente de CAVEIRÃO VOVÔ, que incontáveis vidas salvou, e que foi o PRECURSSOR e amalgamador da doutrina  do emprego de Viaturas Blindadas de Transporte de Pessoal/Tropa, no combate a criminalidade organizada, violenta,  armada de fuzis e granadas e encastelada em terrenos de difícil acesso.

Numerosas campanhas algumas prós e outras contra, inclusive internacionais,  pautaram o uso do CAVEIRÂO, pelas Forças Legais, enquadrando a nova ferramenta policial ora como  AMIGA ora como INIMIGA da Sociedade.

Incontáveis TTP ( Trabalhos Técnico Profissionais), Teses, Dissertações, Artigos Científicos, tomaram o mercado acadêmico, militar e civil usando como tema regular e recorrente, o CAVEIRÂO.


 Finalizo registrando com honra e orgulho profissionais  o recebimento de uma miniatura, muito bem feita por sinal, não catalogando  o nome do artista por infelizmente desconhecê-lo, ( ainda é tempo), do guardião CAVEIRÃO. Tal lembrança me foi ofertada em Dezembro de 2007, após 6 anos de prática técnica e tática de uso no terreno do " Colete à Prova de Balas Coletivo ", pelo então Comandante do 16º BPM, ilustre Cel PM Marcus Jardim, com uma placa de bronze insculpida em sua base na qual se lê, em cópia autêntica : Policia Militar do Estado do Rio de Janeiro, Primeiro Comando de Policiamento de Área, Décimo  Sexto Batalhão de Policia Militar, ao  Cel PM  Wilton Soares Ribeiro, eterno Comandante Geral, PAI DO CAVEIRÃO: LIDERASTE NOSSA CORPORAÇÃO COM VIBRAÇÃO INCOMUM, MAS SOBRETUDO COMANDASTES PELO EXEMPLO. FOSTES TAMBÉM EXEMPLO DE VOCAÇÃO. A MINIATURA OFERTADA È FRUTO DE VOSSA CRIAÇÃO, TRATA-SE DE NOSSO VEÍCULO BLINDADO, CARINHOSAMENTE APELIDADO DE CAVEIRÃO   E QUE HOJE SE CONSTITUI EM NOSSO MAIOR SUPORTE  NA LUTA CONTRA O TRÁFICO ARMADO. MUITO OBRIGADO. Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2007. Marcus Jardim Cel PM Comandante.

É isso aí, MISSÃO CUMPRIDA, esta é a história do CAVEIRÃO.  Obrigado.

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OBS- Não percam as próximas publicações ,  as histórias  do GAM ( Grupamento Aeromarítimo  Ten PM  Antunes) e do GPAE ( Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais).